Diálogo entre saberes na formação de professores do Parque Nacional do Jaú, Am

Dra. Ma. do P. Socorro Rodrigues Chaves 1
Francileide Moreira Lima Bindá 2

RESUMO
Na perspectiva de tomar a relação sociedade-natureza como mútua e complementar, apesar de marcada por contradições inerentes a essa dinâmica de interação, nesse estudo busca-se estabelecer as bases para o diálogo, no plano teórico e prático, entre saberes. Embora se reconheça a complexidade para empreender ações nesta direção. Todavia, os termos que se opõem, também podem aliar-se em alianças fundadas na cultura, que, por excelência, caracteriza-se como instância humanizadora do próprio homem e da mulher na relação com a natureza.

Este trabalho apresenta a experiência de pesquisa e extensão realizada pelo Programa de Formação Continuada de Professores Rurais nas comunidades do Parque Nacional do Jaú (PNJ), nos municípios de Novo Airão e Barcelos, no Amazonas. O processo educacional ocorre nos mais variados contextos sociais dos quais o homem participa. Visto deste modo, a escola não se constitui num locus isolado da realidade daqueles que dela participam, pelo contrário, esta pode ser um mecanismo de fortalecimento da organização social, na medida em que sua estrutura fundamental esteja articulada de forma crítica e consciente.
PALAVRAS-CHAVE: educação; diálogo entre saberes; natureza.

Dialog input knowledges in the teachers' formation of the National Park of Jaú, Am

ABSTRACT
In the perspective of taking the society-nature relation as mutual and complementary, in spite of marking by inherent contradictions to this dynamic of iteration, in this study it seeks establish the bases for the dialog, in the theoretical and practical plan, come in knowledges. Although we recognize the complexity to undertake actions in this direction. However, the has to are opposed, also can ally itself in alliances founded in the culture, which, for excellence, it characterizes as instance to humanize the man and the woman in the relation with nature.

This work introduces the research and extension experience accomplished by the Formation Program Continued of Rural Teachers in the communities of the National Park of Jaú (PNJ), in the municipal districts again Airão and Barcelos, in Amazonas.

The educational process occurs in the varieder social contexts of which the man takes part. Seen thus, school does not constitute in a locus isolated of the reality of those that of her take part, on the contrary, this it can be an invigoration mechanism of the social organization, in the measure in which your fundamental structure be articulated of critical and conscious form.
KEY WORDS: education; dialog input knowledges; nature.
Introdução

A sociedade moderna vive uma complexa e profunda crise social, econômica e política com reflexos simultâneos em toda a esfera global, produzindo um quadro de incertezas e paradoxos. Neste contexto, a rapidez e imprevisibilidade dos acontecimentos colocam a ciência frente a novos desafios, inquietações, questionamentos e conflitos paradigmáticos. Começa-se a questionar a incontestabilidade do conhecimento científico revelando uma ciência que, mais que detentora de verdades e certezas absolutas, abre caminho para novas descobertas e para construção de um diálogo crítico e reflexivo com outras formas de conhecimento.

Entretanto, apesar desta possível interação fazer parte de intensos debates e reflexões, na prática, os espaços e mecanismo de fomento e potencialização desse processo, ainda são incipientes, então como caminhar para a comunicação e colaboração entre o conhecimento científico e o conhecimento tradicional e transcender para uma efetiva interação entre eles?

DEBATES CONTEMPORÂNEOS SOBRE AS DIFERENTES DIMENSÕES DA RELAÇÃO NATUREZA E CULTURA

A história das teorias que abordam a relação da sociedade com a natureza no mundo ocidental tem seguido três tendências básicas: 1) a ênfase no papel dominante do desenvolvimento da sociedade sobre o ambiente físico; 2)a priorização do meio ambiente em relação à dimensão cultural; 3) o entendimento de que a predominância de um elemento ou outro não está pré-determinada, depende de cada situação particular e complexa. 3 Os estudos da relação natureza e cultura têm gerado inumeráveis controvérsias na comunidade científica e enriquecem as discussões sobre a relevância dos saberes populares, de como estudá-los, e de como podem ser melhor elucidados, enquanto exigências de ordem intelectual e/ou prática.

Para Marx, Engels, Geertz (1963) e demais abordagens histórico-estruturais, a relação sociedade-natureza, a problemática ambiental contemporânea resulta das contradições geradas no âmbito das relações de exploração do homem pelo homem, na produção material da vida na sociedade capitalista. 4 Na década de 60, Lévi-Strauss denominou de "a ciência do concreto" todos os saberes sobre a natureza e, que por possuírem características sistematicamente desenvolvidas não podem submeter-se a apenas a uma utilidade prática 5. Gonçalves (apud Cunha, 1994) destaca que ...toda sociedade, toda cultura cria, inventa, institui uma determinada idéia do que seja a natureza, nesse sentido, o conceito de natureza não é natural, sendo na verdade criado e instituído pelos homens. Constitui um dos pilares através do qual os homens erguem suas relações sociais, sua produção material e espiritual, enfim a sua cultura." (p. 8).

Cunha (1998) destaca que, no plano da sociedade moderna, a lógica expansionista industrial possui uma noção de espaço, de território que não contempla a diversidade, ou seja, as diferentes formas sociais de interagir com a natureza. Assim, as distintas formas sociais de apropriação da natureza, dos recursos e do espaço, que se diferenciam do modelo urbano-industrial, são tidas como atrasadas, anacrônicas, inferiores.

Neste sentido, para romper com as forças e as tendências vigentes, será imprescindível o reconhecimento do estatuto dos saberes das diversas culturas; na condição de assumir um desafio histórico que se coloca para a modernidade no sentido de preservar a vida no planeta, de gerar formas alternativas de relacionamento entre sociedade-cultura-natureza. Esse desafio, parece exigir a construção de um projeto societal, que respeite as condições específicas de cada formação social, que conjugue simultaneamente "desenvolvimento e conservação da natureza, tradição e modernidade (...), é preciso, de um lado, conhecer as formas tradicionais de apropriação e utilização do espaço e dos recursos naturais, resgatando toda a sabedoria que as ´comunidades tradicionais` detêm no trato com a natureza (...), de outro, significa a incorporação e atualização desse saber no bojo de um projeto amplo e contemporâneo que seja sustentado, tanto em sentido econômico, ecológico e social." (Cunha, 1998).

A relação sociedade-natureza tem importância central para o estabelecimento do uso dos recursos naturais, nesta perspectiva, Moscoviti (1974) define um caráter novo ao naturalismo, definindo três idéias básicas:

1. O homem e a mulher produzem o meio que os rodeia e são por ele produzidos. A intervenção na natureza faz parte de sua condição humano-social. A forma como intervêm é que faz a diferença.
2. A natureza é parte da história da sociedade.
3. A relação cultura-natureza não ocorre no plano individual mas coletivo. A sociedade pertence à natureza, sendo produto do mundo natural por um trabalho constante de invenção.

Todavia, não obstante se busque promover a convergência entre os termos Sociedade, Cultura e Natureza, não raro, faz-se de modo a evidenciar uma complexa relação de exterioridade. Dentre diversos exemplos, relativos a esta forma de percepção, destaca-se o modo como são concebidas determinadas modalidades de unidades de conservação de uso restrito, onde a natureza é tida como uma variável independente, junto a qual homens e mulheres apresentam-se como meros agentes externos, cujas ações devem ser disciplinadas e unilateralmente ajustadas ao meio natural.

Nas abordagens sociológicas a tendência dominante privilegia a sociedade em oposição à natureza, sem considerar suas especificidades, processos e movimentos próprios, enfim, promove-se uma polarização, onde apenas a sociedade possui estatuto próprio, numa visão descontínua da relação sociedade-cultura-natureza.

AS FORMAS DE GESTÃO DOS RECURSOS NATURAIS VIA SABERES TRADICIONAIS

Na década de 80, a perspectiva de estudo das formas de gestão dos recursos naturais ganhou forte impulso, o que de certo modo demarcou o compromisso em avançar no desvendamento da dinâmica de organização sócio-cultural das populações tradicionais. Identifica-se a estruturação de um campo de ação com perspectivas animadoras para a abordagem das culturas tradicionais na gestão dos recursos naturais, que além do aspecto cognitivo, compreende a dimensão prática desses saberes, esse campo difundiu-se nas organizações internacionais (IUCN, UNESCO, p. ex.) pela sigla TEK (Traditional Ecological Knowledge) e no campo de gestão dos recursos por TEKMS (Traditional Ecological Knowledge and Management Systems). 6

No caso das populações rurais na região, a vinculação de suas vidas e atividades produtivas com as esferas externas ao seu contexto imprime vínculos com ritmos diferentes dos tradicionais à relação com a natureza e entre eles. No entanto, Morán (1990) destaca que ao longo da existência histórica: "... as populações indígenas e caboclas da Amazônia têm-se adaptado ao meio ambiente físico amazônico e às forças externas da sociedade colonial e nacional. Os graus de adaptação ao meio ambiente amazônico que cada uma tem atingido num momento dado varia, em função das forças históricas, sociais e político-econômicas que os têm influenciado. O manejo de algumas sociedades estará menos acoplado ao ambiente físico do que ao ambiente econômico da sociedade brasileira, enquanto que outras terão práticas sofisticadas de manejo ambiental desenvolvidas gradativamente." (p.26)

Em termos diversos aos mecanismos mais simples de adaptação biológica, nos sistemas socioculturais a capacidade cognitiva dos agentes sociais traduz um componente avaliativo, através do qual o próprio contexto contribui/condiciona esforço adaptativo - não apenas os resultados efetivos, mas faculta as potencialidades ou as limitações do próprio processo adotado para alcançá-los. Esta capacidade, inerente aos grupos sociais, os dota de habilidades para construírem de forma cada vez mais criteriosa suas chances de sobrevivência, tomando como orientação os saberes adquiridos e atualizados (Chaves et al., 2001).

Com base em tais conhecimentos, os homens e mulheres procedem a uma triagem no plano de suas inter-relações com o meio que os cerca de forma contínua, não linear e nem determinística. Esses agentes procedem a tal triagem através dos padrões (re) atualizados ao longo da história de seu grupo, pleno de significações, interpretações do real compartilhadas e corporificadas em símbolos e instituições (crenças e mitos, valores e normas, saberes). Esta possibilidade faculta a aproximação entre natureza e cultura, cujas fronteiras, de um modo muito singular, são bastante tênues (Lévi-Strauss, 1978).
No entanto, é importante estar atento às visões homogeneizantes que simplificam os sistemas de representação desses grupos, Godelier (1983) destaca em seus estudos, que uso de determinados recursos e espaços derivam do sistema de representações que são formulados, pelos indivíduos e grupos, sobre seu meio, cujas representações os orientam em sua atuação local.

Na relação sociedade-cultura, as populações tradicionais elaboram e consolidam sua base de conhecimentos, suas atitudes e estratégias de comportamento lidando com os limites (reais e ideais) impostos pela natureza circundante.7 Onde os fenômenos sociais são interpretados sob a égide das instituições a partir do sistema de representações e valores formulados de maneira relacional pelos membros de uma determinada sociedade.

A dinâmica que os agentes sociais estabelecem no interior da sociedade e de seus próprios grupos, na produção de saberes, técnicas e valores, modela uma trama complexa de relações. Nesta trama, a cultura, enquanto síntese do próprio conhecimento assimilado sobre o meio em que os agentes estão inseridos e das inter-relações com ele, atua na mediação da relação dos sujeitos com a natureza circundante, mediante as exigências do seu próprio desenvolvimento, nas formas diversas de percepções e de ações sobre o território e no manejo dos recursos (Chaves et al., 2001).
Percebe-se que não raro a noção de natureza é adotado com sentido unívoco, reificante e exterior desvinculando-o das relações de poder que regem a sociedade: o conjunto entre as diferentes lógicas de uso dos recursos e de acesso aos direitos sociais pelas populações empobrecidas.

Apesar do reconhecimento da existência de novas e inovadoras perspectivas relativa aos saberes tradicionais, reconhece-se o limitado número de ações relativas às demandas sociais dessas populações para além do exercício de investigação científica ou de ações direcionadas por interesses exógenos. Posto que, é preciso não perder de vista o fato de que os saberes tradicionais e suas práticas requerem contribuições práticas que potencializem as formas de organização sócio-cultural e políticas locais. Faz-se necessário ampliar os conhecimentos sobre esses povos que demonstram possuir um imensurável saber sobre seu território, com habilidades e potencialidades para instituir importantes ações de desenvolvimento.

As pesquisas desse novo movimento, sobre saberes tradicionais, acompanham programas cooperativos entre Estado, pesquisadores e comunidades tradicionais para solucionar questões relacionadas ao meio ambiente e ao uso dos recursos naturais. O que ressalta uma surpreendente mudança na consciência etnocêntrica do mundo ocidental, onde quaisquer formas de saber que não fosse oriunda do mundo urbano-industrial eram consideradas como ultrapassadas, sem valor heurístico.

A escola como espaço para diálogo entre saberes

As dimensões da problemática que envolve a escola são extensas, considerando que a educação de forma geral é um tema polêmico, complexo e contraditório. E é a partir do reconhecimento da função social exercida pela escola, ao mesmo tempo conservador e transformador, que se efetuam reflexões sobre a articulação do conhecimento formal e os saberes socialmente construídos. A escola é vista como único espaço onde se veicula o saber formal orientado à capacitação intelectual do indivíduo para viver em sociedade, cujas expectativas correspondem a melhoria da qualidade de vida.

A escola configura-se no mecanismo de reprodução da ideologia dominante, negando o valor da experiência acumulada pelos alunos e reforçando sua exclusão social. Morin (apud Petraglia, 1995) acrescenta: "O desenvolvimento das competências inatas anda a par do desenvolvimento das aptidões para adquirir, memorizar e tratar conhecimento. É, pois, esse movimento espiral que nos permite compreender a possibilidade de aprender. Aprender não é apenas reconhecer o que, de maneira virtual já era conhecido. Não é apenas transformar o desconhecido em conhecimento. É conjunção do reconhecimento e descoberta. Aprender comporta a união do conhecido e desconhecido." (p. 71)

Na visão tradicional da escola o professor era o transmissor das informações e o aluno era o receptor e repetidor das mesmas, sem que estas, na maioria das vezes tenham algum significado para ele. A idéia proposta por Morin, assinala um processo de construção do conhecimento, a partir da interação dos conteúdos conceituais e saberes sócio-culturais. A integração da escola e o seu reconhecimento das instituições sócio-culturias comunitárias é fundamental para diminuir o distanciamento entre essas duas organizações. A esse saber comum, denominado senso, Geertz (1988) chama de bom senso, visto que, " ... é capaz de lidar com os problemas cotidianos, de uma forma cotidiana, e com alguma eficácia ..." (p. 115) . Desse modo, desconsiderar a realidade e a vivência do aluno no processo ensino-aprendizagem, significa perpetuar um educação cujo papel é reproduzir o discurso dominante e atender apenas às exigências do capital.

No meio rural essa problemática é agravada por vários determinantes. A ação da escola é limitada, e em muitos casos restringi-se à reprodução de conhecimentos descontextualizados, isolados e desarticulados da realidade social, econômica e cultural da realidade da zona rural. Para Calanzans (apud Leite, 1981) " ... a escola ao ser levada ao campo defronta-se com as mais diversificadas formas de processos produtivos, com ambientes culturais heterogêneos e com clientelas diferenciadas com valores e aspirações próprias. Metidos nestes grupos populacionais 'desiguais', sem atender à exigência de conhece-los para introduzir ensinamentos a partir de seus saberes, a escola apenas sobrevive." (p. 115).

No contexto das comunidades rurais a escola, como nos centros urbano, também assume um papel contraditório. No caso do Parque Nacional do Jaú , a necessidade de acesso à escola é um dos fatores determinantes na formação de comunidades do Parque Nacional do Jaú - PNJ. Para os comunitários a implantação de uma escola, além de oportunizar a melhoria da qualidade de vida pessoal também serve como um indicador importante para constituição e desenvolvimento da própria comunidade, pois atrai mais famílias, aumentando assim, sua visibilidade e facilidade nas negociações junto as prefeituras locais.

Por outro lado, a escola na zona rural além de enfrentar problemas como: escassez de material didático, merenda escolar insuficiente e não regionalizada entre outros, não corresponde aos interesses dos agentes sociais da zona rural, não propicia uma reflexão crítica desta realidade, não incorpora seus conhecimentos e lhes impõem um modelo pedagógico fundamentada a partir de um referencial urbano, que reforça as desigualdades e a divisão entre um " saber elitizado e culto" dos grandes centros urbanos e o saber "inculto e de pouco valor social" da zona rural.

Formação continuada de professores: uma experiência prática na construção do saber.

Entendendo a educação como um processo de construção coletiva do conhecimento e reconhecendo o importante papel da educação como instrumento de organização social no PNJ, bem como a liderança e a influência exercida pelos professores no interior das comunidades, a FVA através da Coordenadoria Sócio-ambiental, deu início, em 1997, ao desenvolvimento de um programa de formação de professores, em parceria com a Universidade Federal do Amazonas, Secretaria de Educação de Barcelos e o Centro de Trabalhadores da Amazônia (CTA).

Este programa tem como objetivo desenvolver atividades de formação junto aos professores do parque, buscando maior interação entre os conteúdos pedagógicos, as questões ambientais e os saberes e cultura da população local, reforçando o papel da escola no processo de mobilização e organização da comunidade.

Os procedimentos metodológicos norteadores dos cursos dos professores, estão fundamentados num processo sócio-educativo participativo a partir de:

1. Resolução das atividades a partir da problematização dos conteúdos: construção coletiva de conhecimentos a serem trabalhados nos cursos, faz-se a estruturação dos temas e dos conteúdos tendo como ponto de partida um processo de problematização dos aspectos sociais, econômicos e políticos. Esse recorte metodológico oportuniza a instituição de um espaço de reflexão e debate de inúmeras questões que não se esgotam no conteúdo de um texto, pelo contrário geram novos conteúdos que podem ser explorados em qualquer disciplina de forma dinâmica e motivadora para os alunos.
2. Trabalhos em grupo: no desenvolvimento das atividades em grupo, o estímulo à cooperação entre os participantes, resulta em construção coletiva. A formação dos grupos pode ser orientada ou espontânea, conforme a necessidade apresentada pelo próprio grupo. Sempre se trabalha no sentido de que haja, na medida do possível, uma troca ou ajuda mútua entre os integrantes do grupo, direcionando-os para uma ação de cooperação entre os envolvidos e não um estímulo à competição.
3. Participação: a motivação constante à participação dos professores em cada etapa das atividades consiste principalmente na valorização de seus conhecimentos e experiências profissionais, enfocando a necessidade de se buscar, dentro de um processo participativo e construtivo, novos conhecimentos, relacionando-os e trabalhando-os de acordo com a sua realidade.
4. Envolvimento da comunidade nas atividades da escola: os professores trabalhem na sala de aula conteúdos que resgatam a cultura local, e valorizem a contribuição da comunidade, trazendo dessa forma, os saberes locais para a sala de aula. Neste caso, muitos dos dados levantados durante os cursos são obtidos com a contribuição dos comunitários que com seus saberes e habilidades enriquecem o conteúdo e reforçam a importância desse envolvimento/intercâmbio: escola/comunidade.
5. Elevação da auto-estima: os procedimentos metodológicos trabalhados no curso têm como premissa estimular a autonomia de professores e alunos, cujo referencial e fonte de reflexão, na busca de resolução de problemas, são os elementos de sua própria realidade.
6. Material de apoio didático: o material de apoio é constituído dos seguintes itens: dicionário, almanaque abril, fita métrica, mapas mundi, mapas do Estado, do Município e do Parque. Este material tem servido para apoiar o desenvolvimento de atividades como: levantamento de informações, questionamentos, comparações, comprovações, entre outros.
7. Síntese/avaliação: ao final de cada trabalho os professores fazem uma síntese com as impressões e avaliação das atividades do dia. As sínteses podem ser feitas individualmente ou em grupo dependendo da necessidade.
Apoio e monitoramento institucional: além dos cursos de formação, faz parte desse trabalho um conjunto de ações de apoio e monitoramento das atividades didático pedagógicas como o acompanhamento da atuação do professor em sala de aula.
Produção de materiais didáticos: o recurso mais utilizado pelos professores do PNJ, é o livro didático que por sua vez é desvinculado da realidade local e reproduz um modelo social, cultural e econômico de outras regiões. Em fim, nega as condições de vida, valores e crenças dos grupos sociais locais. Faz parte do programa de formação de professores a produção de materiais didáticos que dêem suporte às atividades pedagógicas, trazendo para sala de aula conteúdos que abordem a experiências de vida, interesses e necessidades dos alunos. Materiais didáticos que propiciem a reflexão e favoreçam a interação e o diálogo dinâmico entre os saberes populares e o conhecimento acadêmico.

Diante desta proposta, o Livro de Peixes: série recursos naturais, composto por dois volumes ( livro do aluno e do professor) foi o primeiro material produzido com objetivo de contribuir para o trabalho e reflexão de professores e alunos de 1ª a 4ª série do ensino fundamental do PNJ e da zona rural do Município de Barcelos. Esta produção partiu de um processo de construção coletiva contando com a participação de professores, alunos, comunitários e pesquisadores. A escolha do elemento peixes como primeiro tema gerador desse trabalho, justifica-se pela sua importância cultural, social, econômica, simbólica e ambiental na região amazônica. O livro contém textos com ilustrações de peixes feitos pelos professores, informações científicas e propostas de atividades com abordagens interdisciplinares.

Atualmente o livro está sendo utilizado nas escolas do PNJ e algumas escolas rurais de Barcelos, sobre um processo sistemático de monitoramento de avaliação individual e coletiva. O acompanhamento do uso do livro nos permite dizer que houve a incorporação não só do livro mas da proposta pedagógica do programa de formação de professores. Além disso, há interesse por parte dos professores em dar continuidade a produção de novos livros e outros instrumentos pedagógicos voltados na realidade local dos agentes sociais.

Referência Bibliográfica
CHAVES, M. do P. Socorro Rodrigues. Uma Experiência de Pesquisa-ação para Gestão Comunitária de Tecnologias Apropriadas na Amazônia: o estudo de caso do assentamento de Reforma Agrária Iporá. Tese de Doutorado, UNICAMP, Campinas, 2001.
----- et al. Relatório técnico do Projeto Janelas para Biodiversidade: área sócio-ambiental. Fundação Vitória Amazônica, 2001.
CUNHA, L. H. As comunidades litorâneas e unidades de proteção ambiental: convivência e conflitos, o caso de Guaraqueçabhba (Paraná). São Paulo: NUPAUB-USP, 1989.
FARIA, Ana Lúcia G.de. Ideologia no livro didático. São Paulo: Cortez. Coleção da nossa época, 2000.
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GEERTZ, Clifford. O Saber Local. Petrópolis: Vozes, 1998.
GODELIER, M. L´idéel et le materiel. Paris: Fayard, 1983.
LEITE, Sérgio Celani. Escola Rural: urbanização e políticas educacionais. São Paulo:Editora Cortez. Coleção questões da nossa época, 1999.
PETRAGLIA, Izabel Cristina. Edgar Morin: A educação e a complexidade do ser e do saber. Petrópolis, RJ:Vozes, 1995.
ROUÉ, Marie. Novas Perspectivas em Etnoecologia. In: Castro, Edna & Pinton, Florence. Faces do trópico úmido. Conceitos e novas questões sobre desenvolvimento e meio ambiente, Belém, Cejup UFPE-NAEA. 1997.

1 Professora do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Amazonas, Doutora em Política Científica e Tecnológica; e-mail: socorro.chaves@ig.com.br
2 Assistente Social da Fundação Vitória Amazônica, mestranda em Natureza e Cultura na Amazônia; e-mail: joia@fva.org.br.
3 Ver Morán, 199.
4 "Nós não estudamos o homem individual, mas o das sociedades. E o todo não é a soma das partes"(Roué, 1997:193).
5 Roué, 1997.
6 Este campo foi associado ao movimento de direito de propriedade intelectual, em defesa de agricultores e coletores ante ao capital e, principalmente atribuídos aos grupos indígenas. A adoção do termo "tradicional", por vezes, contém uma razão conservadora que limita a percepção do caráter dinâmico das culturas. Ver Roué, 1997.
7 Viera & Weber, 1995:26.
8 O Parque Nacional do Jaú é uma Unidade de Conservação de uso indireto, formado pelos rios Jaú (principal rio), Unini e Carabinani, localiza-se no Estado do Amazonas, nos Municípios de Barcelos e Novo Airão. Existem no PNJ 10 comunidades, das quais 06 estão localizadas no rio Unini, 03 no rio Jaú, 01 no rio Carabinani, todas com escola.
9 A Fundação Vitória Amazônica é uma Organização Não-Governamental, sem fins lucrativos, sediada em Manaus. Fundada em 1990, com o objetivo de conservação do meio ambiente aliada à melhoria da qualidade de vida dos habitantes da região amazônica, em particular da bacia do Rio Negro, mediante o uso sustentável dos recursos naturais de seus ecossistemas, respeito às culturas e à diversidade étnica regional.